Friday, April 28, 2006

Roque I- A dúvida matemática

Os McQuarries Atkins, Roque e Madruga haviam se encontrado casualmente no Instituto de Física e estavam então se dirigindo para fora dele. O dia ensolarado e o verde vivo do gramado eram um amistoso convite para conversar.
_Vamos descer até o CM?- perguntou polidamente Madruga, na época em que este ainda não falava palavrões.
_Tudo bem, mas eu tenho que passar no IME antes pra falar com o meu orientador- respondeu Roque.
_Ah é, pra quê?
_É que eu estou com uma dúvida num problema e vou pedir ajuda a ele.
Roque continuou andando, possivelmente sem se dar conta da gravidade do que tinha dito. No entanto, aquilo não tinha como passar despercebido por Atkins e Madruga. Estes pararam imediatamente ao ouvir aquelas palavras, estarrecidos. Logo em seguida Roque percebeu que estava andando sozinho e voltou-se para seus amigos.
_O que foi?
Tentando recuperar o fôlego, Atkins e Madruga ainda não conseguiam dizer palavra alguma. A perplexidade tomara conta dos dois, querendo ainda acreditar que seus ouvidos os tinham enganado. Sim, só podia ser aquilo. Talvez na hora em que Roque tivesse falado, o vento tivesse soprado de uma forma diferente, fazendo com que surgissem palavras absurdas de sua boca. Ou talvez ainda fosse uma grande brincadeira de mal gosto por parte dele.
Madruga foi o primeiro a recuperar o fôlego e disse, ainda trêmulo:
_Roque, você está falando sério?
_Sim, por quê?
Não havia dúvida. Estas eram realmente as palavras dele. E não parecia ser uma brincadeira. O mais grave, talvez, era o fato de que Roque não tinha tomado ainda real consciência do que dissera.
Madruga, se esforçando ferrenhamente para não cair diante do desespero, disse, quase que como num apelo:
_Roque, você tem certeza disso? Como é que você pode ter uma dúvida em matemática?
O leitor talvez estranhe a situação. De fato, é bom antes de continuar a história, contar que Roque não é um ser humano comum. Suas façanhas matemáticas seriam capazes de deixar boquiaberto até mesmo Gauss, se este ainda estivesse vivo. Roque enfrentou destemidamente várias matérias de pós graduação no IME, mesmo sendo ainda apenas um aluno de graduação.
Agora que já situamos o leitor prosseguiremos com o nosso conto.
Pois bem, Roque foi até o IME. Atkins e Madruga decidiram não acompanhá-lo, pois temiam as conseqüências deste feito.
Roque entrou na sala de seu orientador.
_O que o traz aqui Roque?
_Bom, é que eu estou com uma dúvida.
Isso foi o suficiente para o professor ficar paralizado. Não só o professor, mas tudo a volta de Roque cessou o seu movimento. Os pássaros que voavam pela USP, os alunos que caminhavam descontraidamente, a folha que cessou a queda do alto da árvore. Mesmo os ponteiros do relógio haviam cessado o seu habitual tic-tac. O tempo havia parado. Toda a Terra e talvez até mesmo o universo haviam se congelado.
Após este breve instante de paralizia, o mundo voltou a si e então o orientador de Roque disse:
_Se você não sabe, acha que eu vou saber?